Eu estava a dois mil metros de altitude quando senti um solavanco chacoalhar o
avião. Tentei manter-me calmo. Olhei de um lado para o outro. “É só
turbulência. Isso é perfeitamente normal. Este é um avião tão antigo quanto o
universo”; pensar desta forma me tranquilizou um pouco.
Quando o avião atingiu três mil
metros de altitude eu pulei para o meu primeiro salto de paraquedas. Naquele
instante o avião tinha seu tamanho normal, a poucos centímetros dos meus dedos
e a terra lá embaixo era muito pequena... Mas no instante seguinte o avião
começou a diminuir e a terra a aumentar... Gradativamente. Não havia onde me
agarrar. Estava só... E caindo trinta metros por segundo, em linha reta como
uma bala.
“Oh, não! – pensei - Você tem certeza de que era isso o que queria? Isso é loucura. Ninguém em posse de sua sanidade faria uma coisa dessas.” É divertido mergulhar pelo céu em queda livre, o problema é quando se começa a pensar no futuro.
Eu caía pelo turbilhão
implacável. Sentia-me cada vez menor na imensidão do ar. Não havia com que se
preocupar, pois em meu peito estava a corda que abriria o paraquedas e eu
poderia puxá-lo no momento que quisesse e além dessa há outra corda do paraquedas
reserva.
“Vou me sentir melhor se puxar a
corda agora? Acho que sim. Mas afinal, que sentido teria o salto? Qual seria a
diversão?”
O altímetro em meu pulso marcava
2500 metros, 2300... Lá embaixo havia uma marca branca, um alvo onde eu pousaria
tranquilamente, dentro de alguns segundos, que eram bem poucos, aliás. Todo
este espaço vazio entre este momento e o momento da aterrissagem... “Vou
aproveitar ao máximo os poucos instantes que tenho de queda livre.”
Empurrando as mãos para frente,
na ventania, eu cairia com os pés para baixo; com as mãos para trás eu
mergulharia de cabeça para o solo. Assim eu voaria sem asas e sem avião, claro
que não havia a possibilidade de subir tão depressa quanto estava descendo. Mil e duzentos metros. Ainda
estava alto, mas estendi minha mão para o cordão de abertura. Prendi-o no
polegar. Puxei e o cabo se soltou. Presumi, depois de ouvir um barulho nas
minhas costas, que pararia de chacoalhar já que o paraquedas estaria aberto.
O chacoalhar continuou. E,
embora eu já devesse ter sentido o choque da abertura do paraquedas principal,
eu continuava caindo livremente. Inexplicavelmente comecei a girar. Alguma
coisa... Algo deu errado.
Olhei para trás e vi que o paraquedas
sacudia preso em uma correia. No lugar de uma grande copa aberta havia um
enorme emaranhado de nylon colorido tremulando ao sabor do remoinho.
Quinze segundos, talvez
dezesseis. Era todo o tempo de que dispunha antes de bater no solo. Olhei e
calculei que se não caísse sobre as árvores, logo abaixo de mim, cairia muito
próximo delas. “Isto é justo? Uma falha do paraquedas no meu primeiro salto?
NÃO! Definitivamente isto não é justo! Afinal, o que importa. LIVRE-SE! Você
deve se livrar do paraquedas principal. ABRA O RESERVA! AGORA!”
Graças a Deus o próximo segundo
levou um minuto para passar. Levantei minhas mãos, que naquele momento pesavam
toneladas, em câmera lenta, levei-as para os meus ombros. Puxei os fechos.
Ninguém me avisou que era tão
difícil alcançar estes fechos.
Lembrei-me do meu instrutor: “Não se esqueça: JAMAIS abra o paraquedas reserva sem estar livre do principal.” Agarrei as pontas dos cordões e puxei-as com uma fúria desconhecida, até então.
Parei de girar. Virei-me de
costas para abrir o paraquedas reserva. Surpreso, descobri que o nylon
emaranhado do paraquedas principal ainda me seguia. Eu mais parecia uma estrela
cadente só que descendo como um raio que rasga o céu. Então, lá estava o paraquedas
principal enredado e preso nos anéis de proteção. Já começava a sentir a relva
tocando minha nuca... a 200km/h.
“Bem... Este é um meio rápido de
morrer. Sempre achei que quando estive a caminho da morte, minha vida passaria
diante de meus olhos como um filme, mas isto não está acontecendo. Afinal, o
que há de errado comigo?”
PUXE O CORDÃO! AGORA!
PUXE O CORDÃO! AGORA!
Puxei o cordão de emergência. O paraquedas
estourou na minha cara e disparando para o céu flutuou ao lado do amontoado,
informe, do principal. Eu, agora, estava preso a dois pistolões virados para
baixo.
O solo se aproximava. Eu já
estava a uns cento e vinte metros das copas das árvores. Projetar-me para a
morte não foi o futuro que eu planejara, mas enquanto o solo se aproximava
senti uma, enorme, vontade de acenar em despedida... Subitamente encontrara as
respostas para todos os meus questionamentos a respeito da morte. Meu tempo se
acabava rapidamente... a escuridão me envolveu...
Nada pude ver durante alguns
instantes e também nada senti.
É muito tranquilo aqui no
paraíso. Chegar aqui foi completamente indolor. Uma canção suave e calma
começou a tocar. “Eu conheço esta canção, mas... Há música no paraíso? Será
que... Não estou no paraíso? Não estou morto!”
Abri meus olhos. O relógio
marcava seis horas. Já era segunda-feira.
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